terça-feira, 2 de abril de 2013

Notícias de fora do quadrado



Um mês e meio depois de começar o nosso projeto familiar de educação algumas notícias e constatações. A primeira é que pela terceira vez em dois meses estamos mudando nossas crianças mais uma vez de escola. Mais uma vez movidos pela total incapacidade de adaptação a uma escola tradicional. Não adiantou o espaço verde incrível. Não adiantou que pudessem ficar na escola de pés descalços. A lição massificada, emburrecedora causou uma antipatia tão grande no menino que nos últimos tempos nem sair do carro ele queria. Em casa a ladainha se repetia em vários momentos do dia: Amanhã não vou pra escola. A escola é chata. Não gosto daquela escola. Tem muita lição. Ele é pequeno mas sabe das coisas e eu não poderia simplesmente negar o que ele estava dizendo porque sei que era verdade. Com a menina, que é mais flexível, tudo parecia correr bem, mas ela se ressentia da quantidade exorbitante de lições por dia. Lições que em nada acrescentavam. Um exemplo: No livro de História, o tema era família. Na lição, a frase a se completar:

A esposa do meu irmão é minha...

Ora, minha filha deu a resposta correta: Meu irmão só tem três anos e não pode casar.

Um dia ela comentou que a professora ficava nervosa e gritava com os alunos que não entendiam a explicação. Perguntei se a professora já havia gritado com ela e ela respondeu que não. Porém não dá pra aceitar que essa atitude vinda de um educador.

Por outro lado, com a quantidade de lições que vinham por dia muitas vezes o nosso projeto ficou em segundo plano. Não era justo impor lições da escola e as atividades do projeto e assim o projeto fora do quadradinho, que a nosso ver, era bem mais pertinente do que as lições de decoreba, ficou espremido. Uma solução foi deslocar o projeto para as noites, mas às vezes o sono chegava antes. Ficamos entre o dilema de atender às formalidades tolas da escola e apostar naquilo que acreditamos. Uma tempestade de ideias, de emoções e, claro, de conflitos. Qual a coisa certa a fazer?

Chegamos, então,  à conclusão que para pais como nós, que acreditam que aprendizagem é algo mais profundo do que simplesmente frequentar um espaço escolar é impossível manter os filhos num ambiente no qual não se confia pelo menos 90%. Não foram só as crianças que não se adaptaram a esse regime escolar. Nós também não nos adaptamos e somos muito exigentes em alguns quesitos. Incomodavam coisas mínimas, como por exemplo, eles chegarem todos os dias da escola impecáveis, limpíssimos. Não havia a mínima chance de terem pego em tinta, em argila, em massinha, em qualquer coisa que saísse do combo "livro/lápis/caderno". Incomodavam os diálogos que mantivemos em algumas vezes com a coordenação e professores. Depois do último escândalo do caçula para não ficar na escola, a professora titular saiu-se com uma pérola: Eu já disse a ele que a escola é o trabalho da criança. Ora, não estamos criando nossos filhos para se tranformarem em pecinhas do capitalismo. Queremos antes de tudo que sejam felizes, criativos, cidadãos, solidários. Obviamente sabemos que a escola foi criada historicamente  para adequar e dominar, porém é preciso acreditar que ela pode ultrapassar essa função tão limitante e castradora.

Escolhemos então uma escola na cidade vizinha, escola na qual em outra ocasião nossa filha estudou (estivemos de passagem por um ano nessa cidade e gostamos muito dessa escola). Não a escolhemos antes por conta do binômio trânsito-distância, porém depois dessas tentativas frustradas em escolas tradicionais acreditamos que esse enfrentamento cotidiano será menos prejudicial do que mantê-los em ambientes pouco desafiadores. É uma escola de pedagogia Waldorf e essa pedagogia, apesar de algumas ressalvas, está mais alinhada a coisas nas quais acreditamos: cultivo da imaginação, incentivo ao questionamento, crença na formação de um ser humano total. De verdade celebro que no estado estejam crescendo as alternativas de escolas que oferecem essa pedagogia.

Quanto ao projeto "Fora do Quadradinho" ele vai se modificar conforme as novas demandas. Não teremos mais a necessidade de nos sobrepor à escola, porque sabemos que esta agora cumprirá bem o seu papel. Mas a experiência de um ambiente de aprendizagem em casa de uma forma mais direcionada (eles aprendem o tempo todo é certo, mas gostamos da ideia de fazermos oficinas com temas para ambos) continua nos atraindo. A ideia é que façamos sem a pressão que nos estava sendo imposta pelas circunstâncias.

Nessa história longa de 3 meses de desacerto ficam algumas tristes constações. A primeira é de que estamos muito mal servidos de escolas no Brasil. Os absurdos são enormes e não há de fato uma diretriz, algo que garanta um nível mínimo de qualidade. O despreparo dos profissionais da educação, em especial nas escolas pagas, é gritante. Digo isso porque já fui professora da escola pública e nesta, apesar dos grandes descalabros que também existem, há um ambiente de formação do profissional que é constante. Se a escola pública dá errado em muitos casos, por outro lado quando dá certo, dá certo lindamente. A segunda constatação é que manter um projeto de educação paralelo a uma escola tradicional é uma quebra de braço injusta. Tendo ao seu lado formalidades legais a serem cumpridas (na forma de avaliações e lições, por exemplo), a escola pode sufocar o desejo de pais como nós de ultrapassar os limites frustrantes que ela impõe. A terceira constatação é que precisamos sempre, sempre mesmo, escutar nossos filhos. É uma violência mantê-los em ambientes despreparados, autoritários e ainda querer que se mantenham saudáveis e equilibrados. Concordo em termos com o ditado que diz que o que não nos mata, nos fortalece. Nenhuma criança ou adolescente deveria ser forçado a conviver num ambiente escolar embrutecedor.

Por fim vamos agora começar mais uma nova adaptação, mas dessa vez confiantes de que estamos tomando a atitude mais acertada.